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quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Platão



Platanus Hispanus, Jardim da Alameda, Faro


Um dos pensadores mais influentes de toda a história da filosofia, nasceu em Atenas cerca de 427 a.C. ando continuidade às preocupações de Sócrates, seu mestre, tentou ultrapassar o relativismo que resultava das doutrinas dos sofistas, incapazes de superar a antinomia entre ser e devir, tal como haviam sido enunciados por Parménides de Élea e Heraclito. É o primeiro filósofo de cujas obras foi preservada uma parte significativa, o que permite reconstituir com grande fidedignidade as traves mestras do seu pensamento.
No núcleo do sistema platónico encontra-se a distinção radical entre o mundo sensível e o mundo inteligível, cada um deles com existência autónoma. O primeiro corresponde ao mundo da corporeidade, contingente e corruptível, domínio da mudança, da diversidade e das aparências; o segundo é o mundo das essências ideais, imutáveis, necessárias e eternas, em suma, da permanência, da unidade e da Verdade universal.
Dotadas de uma existência objectiva independentemente de qualquer sujeito cognoscente, as essências ideais, ou Ideias, são para Platão os arquétipos (modelos) a partir dos quais foram formados - por «imitação», ou mimésis - todos os entes do mundo sensível. O agente dessa intervenção teria sido uma divindade (o demiurgo) que, dessa forma, fez transitar a physis (o mundo físico, a natureza) de um estado primordial de desordem (o caos) à ordem.
No âmbito gnosiológico, o dualismo idealista de Platão tem como consequência, do ponto de vista formal, a inoperância de todo o conhecimento empírico. Este, de ordem indutiva e tomando por base as representações sensíveis, reporta-se apenas a uma realidade contingente e mutável, não podendo elevar o sujeito além da mera doxa (opinião). Do ponto de vista material, por maioria de razão, o conhecimento que tem por objecto a physis é relegado para um plano subalterno em favor de todo o saber baseado na contemplação intelectiva dos puros conceitos, com especial incidência na matemática e na ética. Associando a unidade, a harmonia, a virtude e a sabedoria, tal como Sócrates, Platão coloca no topo da hierarquia das Ideias do mundo inteligível, enquanto elementos unificadores, as ideias de Uno, de Bem e de Belo.
Subsidiária da mesma arquitectónica dualista, a antropologia platónica considera a alma como essência do homem, vendo o corpo apenas como uma prisão que lhe limita todas as potencialidades.
Participando dos atributos do inteligível, a alma é considerada imortal e originária do mundo das Ideias,
pelo que a sua existência no mundo físico deve ser orientada para libertação de todas as solicitações materiais e sensuais através do uso da razão e da prática da virtude, visando atingir o saber da Verdade, num processo de ascese que lhe permita regressar ao mundo de plenitude a que genuinamente pertence.
Esse processo de ascese baseia-se no método que Platão designa como dialéctica e caracteriza-se pelo recurso ao diálogo e à discussão dos conceitos tendo em vista a respectiva consciencialização e esclarecimento, com a finalidade de facilitar a reminiscência (ou anamnese) - isto é, o relembrar – das Ideias que a alma havia contemplado aquando da sua permanência no mundo inteligível.
No que respeita ao pensamento político, Platão foi em grande parte influenciado pela sua ascendência e formação aristocráticas, atribuindo ao regime democrático, geralmente defendido pelos sofistas, a responsabilidade pela decadência de Atenas. Assim, a organização da cidade modelo que sugeriu deixa transparecer uma visão elitista ao gravitar em torno de uma triagem apertada dos cidadãos em que o lugar do indivíduo se esvai, cedendo perante a força do interesse comum ditado pelos «mais aptos».
O objectivo da selecção dos cidadãos seria a distribuição destes em três ordens, de acordo com o carácter que demonstrassem: à ordem dos governantes pertenceriam os sábios, que se deixam conduzir pela justiça, cabendo ao melhor dos quais, após um longo período de formação, o cargo de Filósofo-Rei, autoridade última da cidade; aqueles que se distinguissem pela coragem deveriam integrar a ordem dos guardiões, com a tarefa de zelar pela segurança interna e externa da cidade; os restantes, que se deixam dominar pelas coisas dos sentidos, fariam parte da ordem dos produtores, com a função de prover às necessidades materiais da cidade, cuidando da agricultura, da indústria e do comércio.
Para evitar qualquer elemento de conflitualidade e discórdia na cidade, Platão defende também quer a comunidade dos bens, quer a comunidade das mulheres e dos filhos. Além disso, propõe que todas as crianças deveriam ter uma educação comum para que o processo de selecção dos melhores pudesse decorrer com eficácia e sem desvios.
Platão morreu em 347 a. C. já com idade avançada, deixando, no entanto, um grande número de discípulos que reconheciam a fecundidade das suas teses. A Academia que fundara em 385 a.C. para proporcionar formação a todos quantos o quisessem seguir sobreviveu quase mil anos até ter sido mandada encerrar por Justiniano I em 529 d. C. Porém, a perenidade do seu pensamento foi muito além dessa data, sendo ainda hoje reconhecido o seu legado como um dos mais marcantes para a génese da actual cultura ocidental.

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