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domingo, 12 de julho de 2020

Santo André tem um silêncio especial. Sempre o pensei. Nunca lho disse.
Regressámos, mais uma vez. Regressamos invariavelmente aonde somos. Ela regressa há 9 anos, aonde eu comecei. Não sabe disso. Para ela vem ver os avós. Eu venho ver os meus pais e os meus sítios. Todos os lugares, agora mais pequenos, menos misteriosos, mas totalmente meus. É isto ter uma terra, sem lhe ser dono. Não tenho propriedade. Sou só uma partilha de lugares e momentos que me construíram sem eu saber. Não sei se é a minha terra ou se é a terra a que pertenço. Talvez seja as duas coisas ao mesmo tempo.  O sentimento é o de partilha e pertença, numa relação de reciprocidade. Terra minha, minha terra. Só, nada mais, sem ganância, nem apego. Eu sei que sou a parte impermanente. Santo André continuará com o seu silêncio.
 Ela, a tomar o meu pequeno almoço de sempre, que não é meu, disse no alto dos seus 9 anos: “Gosto deste silêncio! “.
Gosta deste meu silêncio?! Este silêncio, que pensava ser uma deriva dos meus sentidos, da minha imagética. Afinal é real. Doce e lento. É assim que o tenho para mim. Mas ímpar, sem igual. É o silêncio do mar, que se desfaz em ondas na areia grossa da praia da vacaria. Que se mistura com o vento esguio, separado pelas agulhas verdes escuras dos altos pinheiros bravos. É o silêncio trazido pelo canavial de brescos e do espelho da lagoa. Que se envolve com o cheiro a terra escura do pinhal e da caruma, por onde se descobrem os lírios selvagens. E lá atrás, ao fundo, em cada bairro, os sons de uma infância feliz.
Santo André tem um silêncio doce e lento, que nos Inunda e amarra à paz, sobretudo no pôr do sol.

Talvez só os amigos da minha terra compreendam o que é este silêncio.

#santoandré