Platanus Hispanus, Jardim da Alameda, Faro |
No núcleo do sistema platónico encontra-se a
distinção radical entre o mundo sensível e o mundo inteligível, cada um deles
com existência autónoma. O primeiro corresponde ao mundo da corporeidade,
contingente e corruptível, domínio da mudança, da diversidade e das aparências;
o segundo é o mundo das essências ideais, imutáveis, necessárias e eternas, em
suma, da permanência, da unidade e da Verdade universal.
Dotadas de uma existência objectiva
independentemente de qualquer sujeito cognoscente, as essências ideais, ou
Ideias, são para Platão os arquétipos (modelos) a partir dos quais foram
formados - por «imitação», ou mimésis - todos os entes do mundo sensível. O
agente dessa intervenção teria sido uma divindade (o demiurgo) que, dessa
forma, fez transitar a physis (o mundo físico, a natureza) de um estado
primordial de desordem (o caos) à ordem.
No âmbito gnosiológico, o dualismo idealista de
Platão tem como consequência, do ponto de vista formal, a inoperância de todo o
conhecimento empírico. Este, de ordem indutiva e tomando por base as
representações sensíveis, reporta-se apenas a uma realidade contingente e
mutável, não podendo elevar o sujeito além da mera doxa (opinião). Do ponto de
vista material, por maioria de razão, o conhecimento que tem por objecto a
physis é relegado para um plano subalterno em favor de todo o saber baseado na
contemplação intelectiva dos puros conceitos, com especial incidência na
matemática e na ética. Associando a unidade, a harmonia, a virtude e a
sabedoria, tal como Sócrates, Platão coloca no topo da hierarquia das Ideias do
mundo inteligível, enquanto elementos unificadores, as ideias de Uno, de Bem e
de Belo.
Subsidiária da mesma arquitectónica dualista, a
antropologia platónica considera a alma como essência do homem, vendo o corpo
apenas como uma prisão que lhe limita todas as potencialidades.
Participando dos atributos do inteligível, a
alma é considerada imortal e originária do mundo das Ideias,
pelo que a sua existência no mundo físico deve
ser orientada para libertação de todas as solicitações materiais e sensuais
através do uso da razão e da prática da virtude, visando atingir o saber da
Verdade, num processo de ascese que lhe permita regressar ao mundo de plenitude
a que genuinamente pertence.
Esse processo de ascese baseia-se no método que
Platão designa como dialéctica e caracteriza-se pelo recurso ao diálogo e à
discussão dos conceitos tendo em vista a respectiva consciencialização e
esclarecimento, com a finalidade de facilitar a reminiscência (ou anamnese) -
isto é, o relembrar – das Ideias que a alma havia contemplado aquando da sua
permanência no mundo inteligível.
No que respeita ao pensamento político, Platão
foi em grande parte influenciado pela sua ascendência e formação aristocráticas, atribuindo ao regime
democrático, geralmente defendido pelos sofistas, a responsabilidade pela
decadência de Atenas. Assim, a organização da cidade modelo que sugeriu deixa
transparecer uma visão elitista ao gravitar em torno de uma triagem apertada
dos cidadãos em que o lugar do indivíduo se esvai, cedendo perante a força do
interesse comum ditado pelos «mais aptos».
O objectivo da selecção dos cidadãos seria a distribuição
destes em três ordens, de acordo com o carácter que demonstrassem: à ordem dos
governantes pertenceriam os sábios, que se deixam conduzir pela justiça,
cabendo ao melhor dos quais, após um longo período de formação, o cargo de
Filósofo-Rei, autoridade última da cidade; aqueles que se distinguissem pela
coragem deveriam integrar a ordem dos guardiões, com a tarefa de zelar pela
segurança interna e externa da cidade; os restantes, que se deixam dominar
pelas coisas dos sentidos, fariam parte da ordem dos produtores, com a função
de prover às necessidades materiais da cidade, cuidando da agricultura, da
indústria e do comércio.
Para evitar qualquer elemento de
conflitualidade e discórdia na cidade, Platão defende também quer a comunidade
dos bens, quer a comunidade das mulheres e dos filhos. Além disso, propõe que
todas as crianças deveriam ter uma educação comum para que o processo de
selecção dos melhores pudesse decorrer com eficácia e sem desvios.
Platão morreu em 347 a. C. já com idade
avançada, deixando, no entanto, um grande número de discípulos que reconheciam
a fecundidade das suas teses. A Academia que fundara em 385 a.C. para
proporcionar formação a todos quantos o quisessem seguir sobreviveu quase mil
anos até ter sido mandada encerrar por Justiniano I em 529 d. C. Porém, a
perenidade do seu pensamento foi muito além dessa data, sendo ainda hoje
reconhecido o seu legado como um dos mais marcantes para a génese da actual
cultura ocidental.